15.9.06

Interseção


Graças a ti cheguei aqui aonde estou.
Olhei-te de perto e eis que me enxergo nos teus olhos vesgos,
na tua alma torta de paixões perdidas,
de amores achados em meio a armadilhas.
Somos todos só um
e vivemos a exaltar as nossas diferenças.
E insistimos em dar valor às nossas doenças sociais.
Mas só sou porque tu és.
És o que sou e nem sabes.
Sou o que és e nem sei.
Agora que encontro os teus reflexos em meus espelhos,
admito entre surpresa e consolada,
que a humanidade nos une além da morte.
Graças a mim te reconheces único.
Graças a todos nós que levantamos a bandeira da individualidade.
Frágil individualidade que pra nada serve quando a saudade invade e nos quebra em mil pedaços de escuridão.
Desde que me enxerguei nos cacos escuros dos teus espelhos meus
vejo pontes que atravessam as mais duras barreiras dos nossos discursos preparados pra o ataque.
Quando batem os atabaques dançamos juntos as nossas alegrias mais íntimas
por termos sobrevivido às nossas guerras diárias.
E a noite, quando os nossos corpos jogam-se na cama, o nosso suspiro de alívio é ouvido no universo inteiro.
Todos suspiramos juntos o mesmo suspiro e a Terra se enche de novas forças.
Ao amanhecer várias pernas caminham em nossas pernas.
O meu andar impulsiona o teu.
O teu andar inspira os meus caminhos.
Graças a ti meus olhos sabem que não choram sozinhos.
A minha dor é salgada à minha língua, tanto quanto à tua.
Mas quando a mais profunda alegria brota no meu peito, a minha liberdade te liberta e o sorriso desponta em tua face sem que saibas o porquê.
Descobri que o fio que nos une é eterno, infinito.
Que gritamos o mesmo grito de socorro ao cosmos.
Descobri que somos parte de um só coração
E que a humanidade é a nossa interseção.

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