27.10.06

A mulher que espera

Do lado de fora, dentro de mim, espera-me uma mulher.
Roupas coloridas nas mãos, eu sei o que ela quer...
Contempla-me impaciente e ansiosa
Pela demora que levo pra empreender novos rumos.
Olho pra ela e sumo.
Escondo-me atrás dos panos rotos, das cortinas desbotadas da minha alma,
Dos velhos portões da minha velha casa.
A mulher me olha e chora, mas não vai embora;
Recolhe os objetos espalhados nas tentativas de fuga
Põe no cesto as roupas sujas
Joga fora o lixo.
Dou um sorriso a essa mulher tão firme
Que resiste às tempestades de um coração confuso
Que reconstrói os sonhos destroçados pela realidade acreditada.
Eu nada sou sem ela.
Não vou a lugar algum sem tê-la em minha companhia.

Do lado de dentro de mim, me espreito.
Observo o vai e vem dos meus passos indecisos.
A mulher os transformam em dança e eu prossigo a caminhada.
Emito sons dissonantes e doridos.
Ela os arruma em partituras e me faz cantar.
Debato-me em infinitas emoções
E ela me joga ao mar e me lava a alma.
Olho para ela e faço um sinal:
-Calma! Eu já estou saindo.
São os últimos momentos dessa morte.
Agonizo aos despedir-me desses velhos hábitos e jogos inúteis.
- Calma!- eu repito – Já estou despindo-me da velha roupa, do velho rosto sofrido,
do excesso de juízo e da falta de amor por mim mesma.

A mulher me olha; já não chora.
Compreende a demora e não mais me apressa.
Para que eu possa levar apenas o que me serve
E, na pressa, não confunda ouro com lixo.
Olho pra ela e sei que sou eu que ali estou
Sou eu a me esperar com novas roupas e sonhos.
Vejo nos seus olhos as paisagens que desejo ver.
Sou eu que me espero
Com a alma cheia de amor pra me acolher
E uma louca vontade de ver o sol nascer.

18.10.06

Pessoas que nos traduzem III - Leo Buscaglia

Houve um momento da minha vida que andei de mãos dadas com ele. A franqueza e simplicidade das suas palavras me faziam senti-lo bem perto de mim. A minha humanidade era retratada nas aventuras que esse doce mestre me narrava na sua linda caminhada pela vida ensinando nada mais nada menos do que o Amor.

Sua coragem em levar ao meio acadêmico esse "artigo dspensável" e abrir as portas do seu coração para que outros pudessem encontrar as suas chaves internas me fez considerá-lo um homem especial, um Mestre de verdade. Leo Buscaglia toca profundamente o coração:

"Você verá que será maravilhoso o dia em que se der conta de que é singular no mundo inteiro.Não há nada que seja acidente. Você é uma combinação especial, com um propósito, e não permita que lhe digam que não, mesmo que lhe afirmem que o propósito é uma ilusão. (Viva uma ilusão, se for preciso). Você é essa combinação, para poder fazer o que é essencial que você faça. Nunca pense que não tem nada a contribuir. O mundo é uma incrível tapeçaria não realizada e só você pode preencher aquele pequeno espaço que é seu."

"Quando danço no meio das folhas, coisa que faço muitas vezes, vejo que outras pessoas também tomam coragem para ir dançar nas folhas delas. E isso é bom. Se eu puder ensinar alguém a dançar nas folhas, correrei o risco de ser chamado louco. Gosto de ser considerado louco porque, como já disse, quando a gente é considerada louca isso nos dá uma grande margem de comportamento. A gente pode fazer quase tudo e todos dizem: "Ah, é aquele louco do Buscaglia, dançando nas folhas." E eu estou-me divertindo muito e todos os ajuizados estão morrendo de tédio."

"Hoje não pode mais cair uma folha sem que isso nos afete a todos. Não há lugar onde nos possamos esconder. Todos nós afetamos uns aos outros. É uma grande vibração maciça, espalhando-se em todos os sentidos. É bom começarmos a contruir uma dessas pontes, senão as fendas serão tão profundas que nunca conseguiremos transpor.

"Retirado do Livro: Vivendo, Amando e Aprendendo.

12.10.06

Luz!


Do abismo infindável surge a ponte. Assim...como se fosse do nada. Mas é do tudo que há em mim e desconheço. Ainda não conheço toda a geografia que guardo. Do sonho ao despertar são ruas e ruas sem fim; são países diferentes de idiomas distintos que me obrigam a aprender-me incessantemente.

Hoje caminho por uma rua (de mim mesma) calma, segura e iluminada. depois de ter atravessado uma noite escura que não apresentava saídas, onde tudo era escuridão sem lua e estrelas. Coração aos saltos, eu tateava o nada em busca de um milagre. O milagre estava em mim. Apertei o interruptor e a luz se acendeu. Eu saí da noite para a luz e, às vezes, não acesso como isso acontece. Qual o mecanismo que me faz emergir das profundezas da dor para a superfície da esperança? Fico querendo me apropriar dessa "técnica" pra sofrer menos de uma próxima vez. Entretanto, cada vez que isso acontece não é igual à anterior e tenho que me confrontar com o que de mim me é desconhecido; o desconhecido que me tira do controle por não me deixar pistas.

É assim que vou me perseguindo, ou me seguindo, me descobrindo, me caçando. Às vezes gosto; outras não.

Não existem mapas para a alma humana. Ou é um mapa em movimento constante, acrescentando incessantemente estradas, atalhos, desvios...e encontros e desencontros. Sou o meu livro e o meu leitor. Sou a autora dessa história criada por Deus e por mim. Mas Deus não me conta os capítulos que escreve. Ou me conta e eu não entendo! Não sei. Vai ver que a vida é pautada nessa tradução dessa linguagem única e divina. Vou dormir com o sol na cabeça, e nuvens, e céu...Luz, enfim!

2.10.06

Pessoas que nos traduzem II - Khalil Gibran

Menina ainda, tímida e com alma borbulhando de inquietações, busquei nos livros os aliados insuperáveis para acalmar a estranheza que sentia diante das coisas do mundo. Eis que um dia, não lembro-me como, me chega às mãos aquele que responderia ao vendaval de questões que assolavam o meu ser, não com as respostas prontas, mas com reflexões que serviam de pistas para me levar ao lugar onde mais desejava e desejo até hoje: a essência de mim mesma.

Khalil Gibran Khalil. Deus! Alguém no mundo consegue dizer com as palavras certas aqueles sentimentos indizíveis que atormentavam a minha jovem (assim eu pensava!) alma . Não estou sozinha! Gibran foi um fio de ouro que me despertou para o sentimento de unidade; foi o fio que teceu uma teia profunda que me fez perceber que estranhos somos todos nós quando não nos conhecemos e , consequentemente, não reconhecemos, o quanto somos iguais. Ficava a imaginá-lo e a escutar a sua voz sussurrando aos meus ouvidos:

“Não medi minha saudade com a marcha das estrelas, nem lhe auscultei a profundeza. Porque o amor, quando sente saudade do lar, escapa às medidas do tempo e às auscultações do tempo. Há momentos que equivalem a séculos e separação. Entretanto, a separação não passa de uma exaustão da mente. Talvez não nos tenhamos separado.”


“Muitas vezes damos à Vida nomes amargos, mas somente quando nós próprios estamos amargos e sombrios. E consideramo-la vazia e inútil, mas somente quando nossa alma anda vagueando por lugares desolados, e o nosso coração está embriagado pela excessiva preocupação consigo mesmo.”


“...a Vida sorri ao dia; e ela está livre, mesmo quando arrastamos as nossas cadeias.”
( Do livro “O Jardim do Profeta”)